Friday, March 19, 2010

blinded by the light





romantic



still life







Lesley Vance
born 1977, Milwaukee, WI
lives and works in Los Angeles, CA

"The works start out with still lifes—I set up a still life in a dark box in my studio. I have a collection of organic materials, like rocks, shells and horns-sometimes I use a chunk of ceramic. I do each painting in a day, so [the paint] all sits as one layer. It's strange, because the paintings almost look like collage. But I want the image to all be in one layer, so you can't trace the steps backward to the original still life. They only work as their own reality. And yet, they contain moments of the original still life: shadows that don't make sense, but that were there in the beginning."
She said that someone told her that being in the Whitney Biennial was like winning the Super Bowl. I had to explain to them that it's nothing like the Super Bowl. I had to keep telling her it wasn't a competition."

bom conservador


Lisboa, mesmo à bocado

Gosto da ideia da constância, do Kant a passar sempre na mesma rua, à mesma hora, tão pontual que os vizinhos podiam acertar os relógios por ele. Pessoas assim constituem o cimento do mundo, são os seus verdadeiros alicerces.
Nos jornais fala-se da debandada de funcionários públicos dos serviços, incluindo médicos, pessoas com uma carreira feita e paga pelo Estado e que agora aproveitam as circunstâncias para se reformarem vantajosamente e prosseguirem vida activa nos mesmos locais, ou no sector privado. Quem os pode censurar ? São assim as coisas, o vizinho do lado tira proveito, porque não nós ? Já não há bons samaritanos, no fundo são direitos que conquistámos com décadas de trabalho, ou não ?!
Depois existe toda a não-comunicação da burocracia - estatutos e regras especiais, tais como : "quem tiver 55 anos de idade e 30 anos de serviço, tem direito a tal", estando escrito assim quem tiver mais anos serviço ou mais anos de idade já não tem direito à regalia, isto é absurdo ou não ? Isto convida a que se responda na mesma moeda ou não ?
Ontem elogiei um cartaz do Bloco de Esquerda, hoje manifesto a minha irritação por outro : um pai Natal com uma venda no olho "à pirata" convida-nos a partilhar os nossos ficheiros e eu pergunto : então e a propriedade intelectual ? O trabalho de artistas, autores e cientistas não merece respeito, deve ser oferecido à comunidade sem contrapartidas ?
O governo avança com o Plano de Estabilidade e Crescimento(PEC) - basicamente atrás do acrónimo esconde-se a baixa das expectativas e do modo de vida das classes médias para os próximos anos. Mais ainda, reduz, o que chega a raiar a obscenidade as prestações sociais, incluindo o subsidio de desemprego...
Já que é do dinheiro de todos que se trata aqui, interrogamo-nos como foi possível mobilizarem-se tão rapidamente fundos e vontades para salvar bancos e fundos e agora que da economia real se trata, é tão fácil fazer os de sempre amargar com as custas da crise financeira e imobiliária...Same old story.
O mundo está desequilibrado e as assimetrias com a globalização a funcionar como activador do principio dos vasos comunicantes, torna-se num grande nivelador para as classes médias da Terra. Contudo esta nivelação está a fazer-se por baixo e algumas conquistas humanas fundamentais conseguidas no Ocidente durante o século XX vão sendo postas em causa, nas sociedades mesmas onde primeiro foram alcançadas.
Os nossos filhos estão condenados a padrões de consumo de bens materiais muito diferentes dos nossos, isto não tem de ser necessariamente um mal, constitui uma oportunidade imensa de mudar a sociedade, de mudar as vidas de todos, salvar o planeta da nossa sobre exploração vertiginosa.
Não podemos continuar a viver é sobre estas ditaduras de funcionários que se auto-promovem, de políticos que nascem e se retiram nessas sinecuras, de gestores sem ética promovidos a donos do mundo.
Acho que gostar da constância faz de mim um bom conservador.

listen

Thursday, March 18, 2010

essence


Jain Digambara, Tirthankara Standing in Kayotsarga Meditation Posture
India, Karnataka, Chalukyan period, 9th century
Copper alloy; H. 13 1/8 in. (33.3 cm)
The Metropolitan Museum of Art, New York, Purchase, Lila Acheson Wallace Gift, 1995 (1995.423)

The Deccan Plateau and Tamil Nadu were strongholds of the Digambara sect, the "sky clad," or those who go naked. Jainism prospered in the south, attracting patronage from Pandyan and other rulers throughout the first millennium. Most images from that region depict jinas as fully committed renunciants, unencumbered by material possessions. Images of a tirthankara standing in the austerity meditation "body-abandonment" posture are among the most understated and beautiful of the period, and thus successfully embody the essence of the doctrine of renunciation of the material world.

Colorido





só nos faltava acabarem agora os pardais...



House sparrow
Passer domesticus
House sparrows are decreasing alarmingly in Britain, with 64 per cent lost in the last 25 years.

Pardal-comum
Passer domesticus
Uma das mais abundantes espécies da nossa avifauna, e, provavelmente, a mais conspícua, desde há muito que o pardal-comum se estabeleceu em ambientes urbanos, sendo bastante fácil de detectar.
O facto de coexistir com o homem no mesmo ambiente faz com que as suas características sejam facilmente apreciadas. Os machos e as fêmeas apresentam plumagens diferentes, sendo o primeiro caracterizado pelo babete preto, a testa e a coroa cinzentas, os loros escuros e o dorso acastanhado com marcas escuras. As fêmeas não possuem babete nem os loros escuros, apresentando a plumagem acastanhada e uma lista creme desde o olho à nuca. O bico é grosso, como é próprio das aves granívoras.

Abundância e calendário
O pardal-comum é bastante abundante ao longo do território, sendo geralmente ubíquo em zonas humanizadas, tanto em grandes cidades como em aldeias ou lugarejos habitados. Ocorre durante todo o ano, podendo formar bandos de grandes dimensões, especialmente em zonas agricultadas ou em dormitórios de parques urbanos.

como conseguimos chegar à América


Eu gosto de pessoas, fico fascinado a olhar para elas...discretamente, claro.
Ainda hoje no Metro, em frente a mim sentou-se uma verdadeira encarnação de Lolita - blusa verde primaveril, a deixar ver toda a sua fresca feminilidade, num arrojo bem generoso. Grandes auscultadores amarelos nos ouvidos, sublinhavam a sua tenra idade e animavam ainda mais o seu aspecto.
Levanto-me e acima de todas as cabeças, destaca-se um moço, corta-vento preto sob um blusão de ganga gasta, calças de caqui corte aventura, o verdadeiro homem Malboro, enfrentando os desfiladeiros da grande cidade. Mais ao lado, uma moça, soberba composição : sobretudo negro, calças e sapatos castanhos, tudo de corte masculino.
Cabelo pintado de louro, muito curto colado à cabeça, como um jovem oficial (ou o Bowie dos anos de Berlim). Toque final : mala de mão e cachecol femininos e coloridos, é mesmo uma rapariga, e eu fico contente.
Como vêem eu gosto mesmo de pessoas, observo-as desde sempre.
Ontem à noite passeava junto ao rio, quando um bando de pássaros se levantou em alvoroço...lindos, nem sabia que andavam aqui pelo rio. Alguém disparava sobre eles protegido pela escuridão do cais, só o riso idiota os traía, isso e o estampido seco da arma de pressão de ar que usavam.
Uns dias antes, também à noite, num local onde as boas almas deixam comida para os gatos da rua, dois miúdos olham para nós com um riso idiota enquanto passamos, um deles tem um tubo através do qual sopra pedras com que magoa os gatos e os impede de chegarem à comida. A minha mulher tenta convencê-los a terem pena dos animais famintos, a procurarem um divertimento melhor, eles ficam-se imóveis, com o mesmo riso idiota nas caras, a esperar que dobremos a esquina e eles possam continuar a fazer mal porque sim.
Ás vezes, abate-se um desespero sobre mim e fica difícil continuar a acreditar nas pessoas.
Lembro-me então de coisas como a maneira como conseguimos chegar à América e acredito de novo...
(Fazendo cada vez mais longas navegações pelas costas de África, aperfeiçoando os barcos e os conhecimentos de ventos e correntes, aprendendo a navegar longe da costa, descobrindo ilhas e depois tendo todos estes apoios, acreditar e dar um salto maior).
Ainda hoje, podemos ser assim, mas de outras formas completamente erradas também.
No fim é sempre uma escolha de cada um que decide onde se chega.

Wednesday, March 17, 2010

you are a star



found it here


you are a star

you are a star sleeping and dreaming -
dreaming about a star sleeping with a sea star
at the bottom of the sea.

LA FABRIQUE DES IMAGES



LA FABRIQUE DES IMAGES

« UN MONDE ANIMÉ » : L’ANIMISME

La 1e section de l’exposition s’intéresse à l’animisme, c’est-à-dire la généralisation aux nonhumains d’une intériorité de type humain. Toute entité - un animal, une plante, un artefact - est dotée d’une intériorité, animée d’intentions propres, capable d’action et de jugement. Par contre, l’apparence physique change d’une entité à l’autre. Le modèle animiste rend visible l’intériorité des différentes sortes d’existant et montre que celle-ci se loge dans des corps aux apparences dissemblables.

masque "Atujuwa" femelle © musée du quai Branly photo Thierry Ollivier, Michel Urtado

« UN MONDE OBJECTIF » : LE NATURALISME

La formule du naturalisme est inverse de celle de l’animisme : ce n’est pas par leur corps, mais par leur esprit, que les humains se différencient des non-humains, comme c’est aussi par leur esprit qu’ils se différencient entre eux.

Quant aux corps, ils sont tous soumis aux mêmes décrets de la nature et ne permettent pas de singulariser par des genres de vie, comme c’était le cas dans l’animisme.

Cette vision du monde, qui domine en Occident depuis des siècles, doit donc figurer 2 traits :

l’intériorité distinctive de chaque humain
la continuité physique des êtres et des choses dans un espace homogène


arrière cour d'une maison hollandaise, Pieter de Hooch (1629-1684) © R.M.N. photo Gérard Blot

« UN MONDE SUBDIVISÉ » : LE TOTÉMISME

Cette section présente le monde du totémisme, composé d’un grand nombre de classes d’êtres regroupant des humains et diverses sortes de non-humains, les membres de chaque classe partageant des ensembles différents de qualités physiques et morales que le totem est réputé incarner.

Dans les sociétés aborigènes d’Australie, le noyau de qualités caractérisant la classe est issu d’un prototype primordial, traditionnellement appelé « être du Rêve ». Les images totémiques révèlent donc l’identité profonde des humains et des non-humains de la classe totémique : identité interne (ils incorporent une même « essence » dont la source est localisée et dont le nom synthétise les propriétés qu’ils possèdent en commun) et identité physique (ils sont formés des mêmes substances, sont organisés selon une même structure et possèdent le même genre de tempérament et de dispositions).

Pour bien comprendre ce que sont les images totémiques, il faut d’abord se pencher sur le statut général des images en Australie. Elles sont toutes et partout liées aux êtres du Rêve et aux actions dans lesquelles ces prototypes se sont engagés afin de mettre en ordre le monde et de le rendre conforme aux subdivisions qu’ils incarnent eux-mêmes.

Les objectifs figuratifs du totémisme australiens sont mis en oeuvre au moyen de 2 stratégies bien différenciées :

le corps apparaît comme à l’origine de l’image qu’il a engendrée ; c’est par exemple « l’empreinte du corps » d’une peinture sur écorce
la 2nde stratégie montre comment le monde a été formé par des êtres qu’on ne voit pas mais qui ont laissé des traces sur le paysage ; c’est ce que l’on appelle « l’empreinte du mouvement »

peinture sur écorce © musée du quai Branly photo Thierry Ollivier, Michel Urtado

« UN MONDE ENCHEVÊTRÉ » : L’ANALOGISME

La 4e section de la Fabrique des images propose au public de découvrir le modèle iconologique de l’analogisme, modèle inverse du précédent. Avoir sur le monde un point de vue analogiste signifie percevoir tous ses occupants comme différents les uns des autres. Ainsi, au lieu de fusionner en une même classe des entités partageant les mêmes substances, ce système distingue toutes les composantes du monde et les différencie en des éléments singuliers.

Un tel monde, dans lequel chaque entité forme un spécimen unique, deviendrait impossible à habiter et à penser si l’on ne s’efforçait de trouver des correspondances stables entre ses composantes humaines et non humaines, comme entre les parties dont elles sont faites. Par exemple, selon les qualités qu’on leur impute, certaines choses seront associées au chaud et d’autres au froid, au jour ou à la nuit, au sec ou à l’humide.

La pensée analogiste a donc pour objectif de rendre présents des réseaux de correspondance entre les éléments discontinus, ce qui suppose de multiplier les composantes de l’image et de mettre en évidence leurs relations. Quelle que soit l’exactitude de la représentation des détails à laquelle la figuration analogique peut parvenir, elle ne vise pas tant à imiter avec vraisemblance un prototype « naturel » objectivement donné, qu’à restituer la trame des affinités au sein de laquelle ce prototype prend un sens.

On trouve maintes illustrations contemporaines de l’ontologie animiste parmi les grandes civilisations d’Orient, en Afrique de l’Ouest ou dans les communautés indiennes des Andes et du Mexique.

poupée rituelle © musée du quai Branly photo Thierry Ollivier, Michel Urtado

MIRAGES DE RESSEMBLANCES : LES FAUX-AMIS

Le parcours s’achève sur une présentation didactique, côté à côte, d’images ayant des propriétés formelles similaires, mais dont les conventions figuratives répondent à des principes tout à fait différents. Cette ultime étape de l’exposition explique au public comment décrypter ces images pour en mesurer les différences, attirant son attention sur le fait qu’une approche purement formelle des images ne permet pas de mettre en évidence les différentes visions du monde qu’elles expriment.

Grand masque de diablada © musée du quai Branly photo Thierry Ollivier, Michel Urtado

4 thèmes sont ainsi abordés :

la peinture de paysage : une peinture de paysage hollandaise (l’imitation de la nature propre au naturalisme) et une peinture de paysage chinois (une réplique du cosmos propre à l’analogisme)
la figuration humaine : l’homme inscrit dans le cercle du cosmos divin (selon l’analogisme médiéval) et l’homme inscrit dans le cercle de sa propre mesure (selon le naturalisme de la Renaissance)
le portrait : un buste d’ancêtre figuré de façon réaliste (propre à la connectivité analogiste) et un portrait sculpté (propre à la peinture de l’âme naturaliste)
les masques à forme d’oiseaux : un masque de la côte nord-ouest figurant une intériorité de type humain dans un corps animal (propre à l’animisme) et un masque du carnaval d’Oruro, fait d’attributs composites (une chimère analogiste)

Las meninas (update)


Joel Peter Witkin, Las Meninas, NM, 1987

oh well, sounds great...

PISCES (Feb. 19-March 20): In my astrological opinion, you don't need
anything that shrinks you or deflates you or tames you. Influences that
pinch your imagination should be taboo, as should anything that squashes
your hope or crimps your life force. To make proper use of the vibrations
circulating in your vicinity, Pisces, you should gravitate toward situations
that pump up your insouciance and energize your whimsy and incite you
to express the most benevolent wickedness you can imagine. You've got
a mandate to fatten up your soul so it can contain a vaster sense of
wonder and a more daring brand of innocence.

Ninguém é estrangeiro no mundo

É um novo dia, um belo dia diga-se...porquê então, achei o mundo mais velho e as pessoas e as coisas mais cansadas e tristes ?
O Bloco de Esquerda está de parabéns pelo belo cartaz : "Ninguém é estrangeiro no Mundo". no comboio leio sobre novas ideias para o mundo, é uma revista americana, portanto são mais novas ideias para a América, mas os autores crêem a América o mundo...Chegado aqui, onde passo os meus dias, ganho a minha vida, lembro-me do Trenet e salta o "Il y a de la joie" e sim, por uns breves minutos há alegria.
Falta-me preparar um post sobre o Garzon e sobre o iníquo da perseguição que está a sofrer nos tribunais espanhóis, da degradação da politica italiana e como ela espelha um futuro próximo, da soberba alemã, da duplicidade britânica...mas sei que provavelmente não farei nada disto, correrei de tarefa em tarefa e esquecer-me-ei destas e doutras coisas e o mundo avançará, mais velho mais cansado e triste, contudo sempre renovado e pronto para novas partidas.

something nice

Tuesday, March 16, 2010

a cache

click me

autoportrait



hush...




art of a thousand years






The task of "modernising the thousand years old tradition without compromising one's originality and independence" has been challenged by Chinese artists for generations. Many of them have found personal solutions to this dilemma, solutions ranging in efficacy from barely workable to brilliant. Among these, Qiu Deshu stands out as notably successful. Qiu has retained a firm, even tenacious hold on the one of the most unique and profound forms of Chinese art: seal carving. A master in traditional calligraphy and seal carving, Qiu's artistic theory and expression are anything but traditional.
"In the long tradition of Chinese painting, seals and seal carving are one of the most beautiful indigenous art forms. Yet, because of their practical attributes, they were confined to only peripheral significance in painting. In my recent works, I want to explore the full potential of the beauty of the seals. Thus its practicality and relationship with the ink and brush became the essence of my work."

Qiu's idea's on art and the universe are profound: he questions the limitations of illusionism and seeks a universal approach to solving the riddle of the nature of substance - it limitless and ever-changing quality. He draws ideas from Chinese philosophy as well as from Buddhist sources, just as he adapts ancient calligraphic and seal styles. "The images of the bodhisattvas, while blessed by worshippers for centuries, bring to modern mankind a sense of stability, independent, and supernatural effect."

Genesis, Evolution, Sublimation, 1996

be a baby

ancient caligraphy






"Our brain likes to play with symbols. Instead of quarrelling with another person or being depressed by a disaster, we can look at life in a wider sense through symbols in a work of art. It is difficult to cope with a problem that we are facing, but it is extremely helpful to reflect upon our daily struggles while for example looking at a threatening wave in a work by Qin Feng. The wave symbolizes an age- old human combat with fate, which we recognize is more powerful than any daily problem. Looking at a powerful painting therefore is an experience to face life without fear: a personal disaster may be threatening, but compared to the power of nature, expressed in a masterly panting, a problem gets distanced and its threatening presence disappears. Nothing is going to happen to me, while I look at art, on the contrary, a master painting and its inlaid meaning may arise creative thinking and thus help to overcome a problem in real life."

all the text here

Monday, March 15, 2010

I love Stevie

India


Poppy
Dayanita Singh
2006
Silver gelatin print
25x25cm
Courtesy the artist and Frith Street Gallery

História da índia perdida

Que saudades da índia
nunca por mim viajada!
Que dor de a ter perdido algures
em qualquer canto da casa
em qualquer sono profundo
em qualquer vala da estrada
em qualquer canto do mundo
em noite de encruzilhada!

Que mágoa de a ter esquecido
e de agora a lembrar!
Que peso de a ter perdido
num canto anónimo da terra
e de ter olhado os dedos
vazios e destroçados
e sentir todos os medos
novamente nesses dedos
d'Ela poder escapar!

Que desencanto num canto
nenhures a ter deixado!
índia do meu grande pranto
índia do meu sofrimento
que deixei em qualquer lado
como um pobre guarda-chuva
vilmente deixado onde
não há memória que esteja!

Índia da grande promessa
quem sabe lá se esquecida
no fundo duma gaveta
no quarto que abandonei
em não-sei-onde do planeta.

Ganges onde me banhei
templo em que meditei
oh Siva do meu transporte
volúpia acre dos medos
bebedeiras de euforia
espasmo de furor santo
meu júbilo de magna Morte!

Revolta de ter olvidado
as vezes que me cortei
os membros na primavera
para dá-los deslumbrado
a um deus silencioso
em quem tinha fé sincera.

Oh índia abandonada
tudo por culpa da minha
vida feliz e mesquinha
que não presta para nada!
Oh índia abandonada
no fundo duma gaveta
deste nosso planeta!


Herberto Helder